20/06/2006
Vai demorar para os brasileiros desvincularem a Copa do Mundo da desencarnação de Chico Xavier, o médium mais conhecido do Brasil.
Izabel Vitusso
“Quero morrer num dia em que o Brasil esteja feliz”. Seu desejo foi atendido: enquanto o Brasil ainda comemorava o penta-campeonato, em junho de 2002, Chico Xavier serenamente partia para o lugar de origem. Ele era assim: simplicidade, com desejo de servir e não ser servido. Embora o culto à personalidade não faça sentido para doutrina espírita, as histórias que ocorreram em torno de Chico Xavier irão atrair sempre a atenção, pela beleza das ações, que só espíritos com sua categoria são capazes de realizar. São exemplos para serem absorvidos, não cultuados. Por essa razão, o cirurgião plástico paulista Dr. Oswaldo de Castro, 82 anos, que conviveu estreitamente com Chico, em Uberaba, conta com detalhes fatos de sua convivência com o médium.
O senhor é de São Paulo. O que aconteceu que o fez conviver com o Chico?
Sou filho de dentista, e desde de cedo desenvolvi habilidades na profissão com meu pai. Em 1948 ingressei, em Araraquara, na Faculdade de Odontologia. Porém, tinha em mente fazer o curso de medicina.
Em casa éramos católicos. Fazia dois anos que eu havia me formado e minha mãe foi visitar uns tios no interior e, por curiosidade, por curiosidade, ao conversar com um senhor que lia sorte, ele mostrou-lhe uma foto minha. Ele olhou e disse que eu estava na carreira errada. Mas eu não acreditava, não era espírita. Em contato com o médico e dentista Dr. Laet Toledo César – quem trouxe a técnica de medicina para a odontologia – e com quem aprendi muita coisa da Medicina, resolvi fazer o curso.
Eu tinha um assistente aqui em São Paulo formado em Uberaba, que sugeriu que a faculdade de lá convidasse o prof. Laet e eu para fazermos demonstrações, em cirurgia de lábio leporino. Getúlio Vargas acabou fundando a Faculdade de Medicina lá, prestei vestibular e entrei. Quando voltei para casa – por esse motivo acabei me tornando espírita – uma tia, católica, que tinha mediunidade [ostensiva] transmitiu a mim uma mensagem de um espírito que rendia graças a Deus por eu ter ido a Uberaba, dizendo ser lá meu lugar. Quando Chico mudou-se para Uberaba, em 1959, eu já estava no sexto ano [do curso de Medicina].
Como então o senhor conheceu o Chico?
Quando eu estava no quarto ano de medicina, já era casado. Quando meu primeiro filho Max estava com 2 anos, começou a manifestar a mediunidade. Eu não tinha amizade com Chico, mas ele estava lá hospedado com Waldo [Vieira] antes de se mudar. Pensei. Bem que o Waldo podia passar para dar um passe no menino. Eles apareceram. Foi dado o passe e constatada a mediunidade. O espírito para de atuar no menino e atacou a minha esposa.
Na época, eles tinham cercado o terreno para fazer a Comunhão Espírita ao lado. Chico disse “vai abrir o centro e assim começar a sessão de desobsessão, vocês estão convidados.” Participei com a minha esposa desde o início, até retornar para São Paulo. Quando acabei a faculdade, voltei, mas ia sempre para Uberaba operar.
O senhor foi médico do Chico?
Eu o tratava com homeopatia. O médico do Chico era o Eurípedes Cahan, muito meu amigo. Ele clinicava nos Estado Unidos. E tem um fato interessante que ocorreu. Certa vez, ele e o Waldo, levaram o Chico para a Inglaterra e estados Unidos, com a finalidade de difundir o Espiritismo. Ao saírem pelo centro de Nova Iorque, um senhor porto riquenho bateu nas costas do Chico, falando em sua língua que sua mulher estava muito mal. Chico tomou nota do endereço, dizendo que no dia seguinte estaria lá. A mulher estava obsediada. Com o passe dado, o ambiente ficou todo perfumado e a água fluida, leitosa. Chico falou em castelhano fluente. Eurípedes disse: “que negócio é esse de falar castelhano?”. Chico explicou: “Não fui eu, foi a avó dele quem falou.”
O senhor conhece fatos ainda inéditos sobre o Chico. O que lembra para contar? O caso da peruca
Existem fatos que, pela modéstia do Chico, são mal interpretados. O potencial mediúnico dele é imenso. Seu campo vibracional e de sensibilidade era extraordinário.
Muitas pessoas disputavam com ciúme o convívio com ele. Ele ia fazer a peregrinação, uns queriam pegar no braço de cá e outro de lá. Ele, muitas vezes recebia fluidos terríveis. Ele resolveu colocar a peruca para evitar que tocassem em sua cabeça, onde tinha maior sensibilidade. Ele não tinha vaidade nenhuma.
Sua estada em Pedro Leopoldo – MG
Chico era funcionário do ministério da Agricultura em Pedro Leopoldo. Dez anos antes dele se mudar de Pedro Leopoldo para Uberaba, isso Chico me contou, ele foi ate lá para uma exposição de gado. Quando chegou, um espírito e falou “um dia você vai vir para cá”, mas o Chico não levou a sério. Ele sofria uma perseguição muito grande da imprensa, do clero em Pedro Leopoldo. Existia um frei, Boaventura, que fazia campanha muito grande contra o Espiritismo e certa vez ele foi a Pedro Leopoldo procurar Chico. Ficou mais de duas horas trancado, conversando, tentando convencer o Chico para que, a troco de muito dinheiro, relegasse o Espiritismo. Chico disse que estava muito feliz com o plano espiritual.
Waldo Vieira aparece para Chico
Todo mundo conhece a história do Chico que via a mãe em espírito, no fundo do quintal, assim que ela desencarnou. Certa vez, ele me confidenciou que não era só sua mãe que aparecia, mas outras entidades. Via Waldo Vieira também. Em uma de suas encarnações, na Espanha, o médium – Waldo Vieira [que trabalhou mediunicamente com Chico] foi seu filho e foi levado por um circo que percorria o país, quando tinha uns 6 anos. Chico disse que chorou muito, mas era muito pobre e tinha dificuldades para procurá-lo. “Fiquei vinte anos procurando o menino; quando eu consegui localizar o circo, me disseram: seu menino foi morto a doze anos.”
Quando ia brincar com o menino no primário, Waldo aparecia pra mim e me avisava “não brinca com esse menino, que ele não te serve”. Certamente Emmanuel estava por trás mais não parecia. Certa vez, Waldo se apresentou e disse: “Chico, eu vou me despedir porque preciso reencarnar. Não saia de perto de Leopoldo que um dia eu venho te buscar, mas o Emmanuel nunca lhe havia dito onde Waldo havia reencarnado.
Nascido em Monte Carmelo – MG, Waldo foi orientado por uma médium extraordinária para que fosse estudar em Uberaba, que lá muita coisa iria se desencadear. Acolhido pelo professor Mário Palmélio, teve estudo e moradia de graça. Ele era inteligente e estudioso. Fez o ginásio, o científico, conhecia a doutrina, mas ainda não havia tido contato com Chico era perseguido em Pedro Leopoldo, e ficava apreensivo pelo trabalho de receituário que realizava.
O senhor sabe como ocorreu o encontro entre Chico e Waldo Vieira nesta encarnação?
Ao encontrar pela primeira vez Waldo, Chico ficou emocionado, mas não disse nada. Passado um ano, Waldo Vieira foi visitar o médium em Pedro Leopoldo, encontrando-o em sofrimento, com repercussões na saúde. Chico não podia continuar mais ali. Disse, então: “Chico, eu vim te buscar. Você vaia para Uberaba”. Quando ele falou isso, os dois choraram emocionados!
O Chico chegou a comentar por que Waldo Vieira não continuou com sua tarefa no mandato mediúnico?
Chico nunca comentou muito a respeito. Dizia apenas que Waldo, quando foi para os Estados Unidos, caiu numa personalidade do passado e deixou completamente a Doutrina. Sua mediunidade era extraordinária. Depois que chegávamos da perigrinação, eram realizados trabalhos mediúnicos e me lembro do fato do Chico e Waldo receberem um soneto em parceria. Enquanto uma parte era psicografada por Waldo, o Chico ficava parado, depois, alternavam. A psicografia de um completava a do outro. Também, quando Chico estava para mudar, ele escreveu Evolução em dois mundos. Um capítulo ele recebia, de André Luiz, lá em Pedro Leopoldo e outro, Waldo Vieira recebia em Uberaba.
Casos com o Waldo Vieira
Certa vez, diante da fila que se formava em frente à Comunhão Espírita Cristã para recebimento das cestas de alimento, Waldo disse que tinha tido um sonho. “Eu vi todo esse pessoal aqui na fila, mas nós estávamos fardados.”
O entendimento desse sonho vem através da explicação do Dr. Bezerra [de Menezes], que havia lhe dito que lá pelos anos 60, 70 d.C., Eurípedes Barsanulfo era general e perseguidor do Cristianismo e o Waldo também. Eurípedes se converteu ao Cristianismo, chegou para as tropas e disse: “em nome de Jesus Cristo, deponham suas armas.” O Waldo foi o primeiro.
Eurípedes, através de reencarnações, foi reunindo aquelas vítimas, que acabaram por reencarnar em Sacramento[MG], onde ele nasceu e desencarnou cuidando de todos até o fim, vitimados pela gripe espanhola. Bezerra diz que Eurípedes Barsanulfo, para ser um Eurípedes Barsanulfo demorou mil e oitocentos e tantos anos, (não me lembro quanto). Eurípedes, querendo ou não, teve a rua com seu nome. “A praça de guerra de Eurípedes se transformou em praça da caridade” – fazendo referência ao nome da rua Professor Eurípedes Barsanulfo, onde fica a Comunhão Espírita Cristã. Chico disse que Eurípedes é tão humilde que não deixa aparecer. “Eu sei que ele nos ajuda.”
Foi o senhor quem operou Chico?
Chico tinha um problema de saúde e precisava ser operado. Bezerra havia dito que caberia a ele escolher quando. Chegando de viagem, da Inglaterra, Chico me disse que iria fazer a cirurgia e que eu tinha que estar nisso. Perguntei: “por que eu”? Não sou urologista (ele tinha problema da próstata que estava judiando muito). Organizei a equipe, disse que era para uma pessoa que eu queria muito bem, mas não revelei quem seria operado. Falei com um amigo: Américo Zopi, que me lembrou que eu poderia falar com outro amigo, urologista, Levi.
Chegamos ao Hospital Santa Helena [em São Paulo], onde eu operava e, mo portão, Chico disse: “André Luiz está me falando para não deixar dar adrenalina para mim que vai fazer mal”. Chico ficou internado no 7º andar, no quarto 72. Isso foi no dia 29 de agosto de 1968. Instalado, ele começou a dar notícias dos aparelhos espiritualmente instalados nos cantos do quarto. Disse serem resultantes das preces feitas em benefícios dos doentes internados lá antes. “É para esterilização do ambiente”, explica Bezerra. Também comentou que foi levado a conhecer o trabalho que se realizava espiritualmente, no subsolo para socorro dos espíritos que desencarnavam naquele hospital, antes de seguirem para outros planos. Segundo Bezerra, aquela instituição tinha um carinho especial da espiritualidade, pelo trabalho de assistência social que realizava. Pertencia à Fundação que também fundara o hospital Alemão, hoje Oswaldo Cruz.
Quando Chico foi para a sala de operação, saiu na maca e fez sinal de despedida, sorrindo. No pós-operatório, falou que já não era ele. “A Meimei me tomou o corpo 48 horas, até passar o pós-operatório”. Também no pós-operatório, deu-se a entender que os espíritos faziam fila para cumprimentá-lo. Ele estava tranqüilo e de repente dizia: “Ah! Auta de Souza! E na seqüência, dizia outros nomes.” Vendo que se tratava do Chico, o paciente a ser operado, o Levi disse: “você não é o Xavier?” Chico respondeu daquele seu jeito: “É...seu criado...”
Quando estava terminando a operação, surgiu a dúvida de quem iria operar a hérnia estrangulada do Chico [em decorrência das garfadas na barriga, que levara, quando criança da madastra]. Eu pensei, bem que Américo Zopi podia estar aqui. Ele entendia e operava muito bem. De repente, ele entrou sem ser chamado, dizendo: “precisam de ajuda aí?” Terminada a cirurgia, eu fui acompanhá-lo até o quarto. Nena, Galves, [amigos íntimos do médium, fundadores do Centro espírita União em São Paulo], minha esposa, Terezinha, ficaram em vibração e quando eu disse que o Américo é quem havia operado a hérnia, Nena disse que já sabia: “um espírito passou por aqui e nos avisou”.
Quando teve alta, para não magoar ninguém, já que só avisaram sobre a cirurgia depois de terminada, ele quis visitar uma pessoa não espírita, para não gerar ciúme. Foi visitar Tarsila do Amaral. A artista, que pintava sentada em uma cama alta, disse ao Chico que o dia que ele recebesse o título de cidadão paulistano, ela estaria presente numa cadeira de rodas. Mas não deu tempo. Desencarnou. Quando Chico recebeu o título, ele a viu presente espiritualmente na cadeira de rodas.
Chico foi um verdadeiro apóstolo!
Jornal Correio Fraterno – Maio/Junho de 2006
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