Allan Kardec,
da obra “O Evangelho Segundo o Espiritismo”
112a edição. Capitulo XIV, no.8.
Os laços do sangue não criam forçosamente
os liames entre os Espíritos. O corpo procede do corpo, mas o Espírito não
procede do Espírito, porquanto o Espírito já existia antes da formação do
corpo. Não é o pai quem cria o Espírito de seu filho; ele mais não faz do que
lhe fornecer o invólucro corpóreo, cumprindo-lhe, no entanto, auxiliar o
desenvolvimento intelectual e moral do filho, para fazê-lo progredir.
Os que encarnam numa família, sobretudo
como parentes próximos, são, as mais das vezes, Espíritos simpáticos, ligados
por anteriores relações, que se expressam por uma afeição recíproca na vida
terrena. Mas, também pode acontecer sejam completamente estranhos uns aos
outros esses Espíritos, afastados entre si por antipatias igualmente
anteriores, que se traduzem na Terra por um mútuo antagonismo, que aí lhes
serve de provação. Não são os da consangüinidade os verdadeiros laços de
família e sim os da simpatia e da comunhão de idéias, os quais prendem os
Espíritos antes, durante e depois de suas encarnações. Segue-se que dois seres
nascidos de pais diferentes podem ser mais irmãos pelo Espírito, do que se o
fossem pelo sangue. Podem então atrair-se, buscar-se, sentir prazer quando
juntos, ao passo que dois irmãos consangüíneos podem repelir-se, conforme se observa
todos os dias: problema moral que só o Espiritismo podia resolver pela
pluralidade das existências (Capitulo IV, no.13).
Há, pois, duas espécies de famílias: as
famílias pelos laços espirituais e as famílias pelos laços corporais. Duráveis,
as primeiras se fortalecem pela purificação e se perpetuam no mundo dos
Espíritos, através das várias migrações da alma; as segundas, frágeis como a
matéria, se extinguem com o tempo e muitas vezes se dissolvem moralmente, já na
existência atual. Foi o que Jesus quis tornar compreensível, dizendo de seus
discípulos: Aqui estão minha mãe e meus irmãos, isto é, minha família pelos
laços do Espírito, pois todo aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos
céus é meu irmão, minha irmã e minha mãe.
A hostilidade que lhe moviam seus irmãos se
acha claramente expressa em a narração de São Marcos, que diz terem eles o
propósito de se apoderarem do Mestre, sob o pretexto de que este perdera o
espírito. Informado da chegada deles, conhecendo os sentimentos que nutriam a
seu respeito, era natural que Jesus dissesse, referindo-se a seus discípulos,
do ponto de vista espiritual: "Eis aqui meus verdadeiros irmãos."
Embora na companhia daqueles estivesse sua mãe, ele generaliza o ensino que de
maneira alguma implica haja pretendido declarar que sua mãe segundo o corpo
nada lhe era como Espírito, que só indiferença lhe merecia. Provou
suficientemente o contrário em várias outras circunstâncias.
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