Então os discípulos voltaram para
casa, mas Maria ficou chorando fora, junto à entrada do sepulcro.
Enquanto chorava, abaixou-se para
olhar para dentro do sepulcro, e viu dois anjos vestidos de branco, assentados onde
estivera o corpo de Jesus, um à cabeceira e outro nos pés.
Os anjos perguntaram:
- Mulher, por que choras?
Ela respondeu:
- Levaram o meu Senhor, e não sei
onde o puseram.
Tendo dito isto, voltou-se e viu Jesus
ali em pé, mas não percebeu que era Jesus.
Perguntou-lhe Jesus:
- Mulher, por que choras? - À quem
procuras?
Pensando tratar-se do Jardineiro,
ela respondeu:
- Senhor, se tu o levaste, dize-me
onde o puseste, e eu o irei buscar.
Disse Jesus:
- Maria!
Ela, voltando-se, disse em hebraico:
Raboni! (que quer dizer Mestre).
Disse-lhe Jesus:
- Não me detenhas, pois ainda não
voltei ao Pai. Mas vais ter com meus irmãos, e dize-lhes:
- Eu volto para meu Pai e nosso Pai,
meu Deus e nosso Deus. Maria Madalena foi e anunciou aos discípulos:
- Vi o Senhor! E disse que ele lhe
falara estas coisas.
A mensageira da
ressurreição, como ficou conhecida Maria de Magdala, deixou registrada sua
história, que somente há bem pouco tempo os cristãos começaram a descobrir na
palavra do Evangelho.
Maria representa
todos aqueles que têm um comportamento emocional, afetivo e sexual diferente
daquele que a maioria considera correto e diz ser normal. Seu estilo de vida
chocava, por fugir aos padrões religiosos e morais de seus contemporâneos. Sua
conduta, considerada pecaminosa pelos religiosos, era a marca de sua personalidade.
O comportamento emocional e sexual que lhe foi atribuído ao longo destes dois
mil anos representa todos aqueles que ainda hoje adotam ou têm um comportamento
emocional, afetivo e sexual que é classificado pelos moralistas como
comportamento alternativo.
Mas a história de
Magdala traz luz claríssima sobre as ações ou reações que carecemos aprender,
mesmo sendo nós, pretensamente, representantes e apologistas das verdades
evangélicas.
Quando Maria foi ao
encontro de Jesus em Cafarnaum, ela não se transformou primeiro para depois ir
em direção ao Mestre. Também em momento algum lhe foi exigida qualquer mudança
em seu comportamento, interpretado e mal-interpretado em todas as épocas.
O Evangelho
representa o encontro do Céu e da Terra. O divino e o humano.
Maria de Magdala,
simplesmente, foi ao encontro de Jesus, e Ele jamais lhe impôs qualquer
exigência de modificação, por entender que cada um tem o momento certo de
despertamento. Jesus simplesmente a recebeu, inebriando-a com seu amor e conquistando-lhe
para sempre o respeito. No Evangelho, nenhum relato quanto à exigência de
mudança; nada que indique a urgência de um comportamento padronizado pela
ignorância e os preconceitos humanos.
Maria Madalena,
inspirada pelo encontro com Jesus, enriqueceu sua vida com novas experiências
espirituais, sem deixar de ser humana. A experiência humana é o maior
empreendimento que o espírito eterno tem diante de si. Não é exigido de ninguém
que deixe de ser o que é.
Vejamos, por exemplo,
a parábola da ovelha perdida, cujo conteúdo é sempre atual. Na linguagem
figurada empregada pelo Mestre, a ovelha estava desgarrada, perdida,
desamparada. O pastor deixa então as 99 ovelhas no aprisco e vai em busca
daquela que se havia desgarrado. Ele a encontra, cura-lhe as feridas, coloca-a
em seus ombros, acolhendo-a. Em seguida, ela retorna feliz ao convívio das
demais.
A parábola não
registra condenação por parte do pastor; em instante algum ele questiona a
ovelha sobre o porquê de seu comportamento, que difere daquele adotado pelas
demais; não encontramos por parte do pastor nenhuma pergunta que denote o
realce das diferenças. Ele simplesmente cura suas feridas, deposita-a sobre
seus ombros e retorna com a ovelha para o aprisco. Ainda sob a luz do
Evangelho, notamos que a experiência de desgarrar-se das demais ovelhas foi
necessária, valiosa e, pela reação silenciosa do pastor, valorizada em si
mesma.
Maria de Magdala, em
sua história de vida, vibrante e repleta de exemplos de grande riqueza, faz-nos
refletir a respeito da nossa compreensão daqueles que agem e que têm um
comportamento diferente da maioria. E quando falamos em comportamento
emocional, afetivo e sexual diferentes, não estamos ajuizando que tal
comportamento seja pior ou melhor. Não estamos fazendo apologia nem mesmo
realizando julgamentos com conotações moralistas. Detemo-nos apenas a analisar
as ações e reações de Jesus quanto às experiências humanas. Respeito,
valorização da experiência humana, incentivo discreto ao progresso e às
melhoras íntimas, tanto quanto compreensão generosa com relação ao momento
evolutivo de cada um.
Ainda assim, o divino
enviado encerra sua mensagem a todos nós transformando Maria de Magdala, aquela
que se comportava de modo diferente, em mensageira da ressurreição.
Esta mensagem é uma
das mais importantes do Evangelho, por isso perpassa todo o seu texto: Jesus
não se utiliza de pessoas santas, resolvidas ou que tenham um comportamento
emocional, social ou sexual considerando exemplar. Ele tão-somente valoriza o
que de bom cada um traz dentro de si.
Maria de Magdala
continuou sendo mal-interpretada e rejeitada pelo colégio apostólico, que a
recebe cheio de dúvidas e preconceitos. Todavia, assim mesmo, foi ela a
escolhida para anunciar a ressurreição. Sua mensagem permanece ainda hoje como
desafio ao entendimento do homem e do cristão do século XXI.
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