As sublimes lições não
paravam de iluminar as consciências dos discípulos interessados no conhecimento
da Verdade.
Cada momento em companhia do Mestre amado revestia-se de um aprendizado
inolvidável.
Jamais houvera alguém que pudesse, como Ele o fazia, cantar a beleza da
sabedoria com a linguagem singela de um lírio alvinitente em pleno chavascal.
As Suas palavras eram como pérolas reluzentes que formavam colares
luminosos na consciência dos ouvintes.
Ele nunca se repetia. Com as mesmas palavras entretecia variações
incomuns em torno dos temas do cotidiano, oferecendo soluções simples, às
vezes, profundas, com a mesma naturalidade com que se referia ao Pai, o Seu Abba.
Ressoavam nos refolhos das almas o canto incomparável do Sermão da
Montanha, que se lhes tornara o novo norte para o avanço no rumo da augusta
plenitude.
Cada bem-aventurança era portadora de um novo conteúdo, como sendo a
diretriz soberana do amor em relação ao futuro da Humanidade.
Ninguém ficava à margem, nenhum sentimento era esquecido e a fonte de
inexaurível sabedoria continuava a fluir a água lustral dos ensinamentos
imortais.
Ele parecia ter pressa de preparar os amigos, embora não fosse
apressado.
Eram tantas as necessidades humanas que não era possível desperdiçar o
tempo em cogitações da banalidade e emprego das horas em pequenezes habituais
do comportamento.
Mais de uma vez Ele falara sobre a emoção do amor e a bênção do perdão, sendo,
porém, enfático em todas elas.
O perdão é sempre melhor para aquele que o concede.
Para que não ficasse esquecido entre as preocupações que assaltavam os
amigos, na sua labuta diária, Ele voltava ao tema com novas composições.
Já lhes dissera que se fazia indispensável perdoar setenta vezes sete
vezes, o que significava perdoar incessante, ininterruptamente...
Naquela oportunidade ímpar, complementou o ensinamento, referindo-se à
conduta pessoal de cada criatura:
Portanto, se estiveres apresentando a tua oferta no altar, e aí te
lembrares de que teu irmão tem alguma coisa contra ti, deixa ali diante do
altar a tua oferta, e vai conciliar-te primeiro com teu irmão, e depois vem
apresentar a tua oferta...
... Concilia-te depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho
com ele, para que não aconteça que o adversário te entregue ao guarda e sejas
lançado na prisão.
Em verdade, vos digo que de maneira nenhuma saireis dali enquanto não
pagardes o último ceitil. (*)
Tratava-se da aplicação da misericórdia nos relacionamentos, de modo a
manter-se a consciência de paz.
Nesse sentido, a compaixão em relação aos erros alheios assumia papel de
preponderância, mas os amigos aturdidos compreendiam que lhes era muito difícil
a mudança de conduta, habituados ao desforço em relação àqueles que os
prejudicavam.
Assim pensando, após a exposição do Senhor, Tiago perguntou-Lhe,
recordando-se da severidade da Lei Antiga:
Como é possível, Mestre, permitir-se que o agressor fique impune, após a
prática do seu ato perverso?
O Iluminado olhou-o com imensa ternura, por saber que ele era cumpridor
dos deveres, severo em relação a si mesmo, portanto, exigente no que diz
respeito ao comportamento dos outros e compreendeu-lhe a inquietação.
Após um breve silêncio, ante o zimbório celeste, recamado de estrelas
que lucilavam ao longe, respondeu benigno:
As águas do rio limpam as margens e o leito por onde correm,
transformando e decompondo o lixo e a imundície em rico adubo mais adiante,
levados pela correnteza.
Assim também o amor de misericórdia transforma a agressão em bênção para
a vítima, auxiliando o inimigo a purificar-se, ao largo do percurso evolutivo.
Quando se perdoa, isto não implica anuência com o erro, com o crime, com
o descalabro do outro. Não se trata de desconhecer a atitude infeliz, mas
objetiva não retaliar o outro, não aguardar oportunidade para nele
desforçar-se.
Não devolver o mal que se sofre é o início do ato de perdoar. Compreender,
porém, que o outro, o agressor, é infeliz, que ele se compraz em malsinar
porque é atormentado, constitui a melhor reflexão para o perdão radical, o
perdão sem reservas.
Ninguém tem o direito de oferecer ao Pai suas orações e dádivas de
devotamento, se tem fechado o coração para o seu próximo, aquele que, na sua
desdita, derrama fel sobre os outros e cobre a senda que percorrerá no futuro
com os espinhos da própria insanidade.
Ter adversário é fenômeno normal na trajetória de todas as criaturas, no
entanto, deve-se evitar ser-lhe também inamistoso, igualando-se em fraqueza
moral e desdita interior. Quem assim se comporta também sofrerá julgamento da
autoridade, a quem seja apresentada queixa, e essa poderá exigir-lhe o
ressarcimento do mal até o último e mínimo ultraje.
É o que ocorre com qualquer ofensor ou ofendido magoado. É obrigado a
refazer o caminho sob a jurisdição divina, até quitar-se de todas as mazelas e
débitos morais.
O interrogante, no entanto, insistiu:
Como então fica a justiça diante daquele que lhe desrespeita os códigos
austeros?
O Amigo compassivo compreendeu a inquietação do companheiro e elucidou:
A questão da justiça não pertence ao ofendido, mas aos legisladores que
aplicarão a penalidade corretora que se enquadre nos códigos legais. E quando
isso não ocorre, a sabedoria divina impõe-se ao calceta, que carrega na
consciência o delito, fazendo-o ressarcir os danos com a sua cooperação ou
sofrendo os efeitos do mal que praticou, imputando-se sofrimentos reparadores. Ninguém consegue fugir à consciência
indefinidamente, porque sempre há um despertar para a realidade transcendental.
Mas, Mestre, nesse caso, todos os crimes de qualquer porte devem ser
perdoados e esquecidos? - Instou,
inquieto,
Serenamente, Jesus retorquiu:
Não há crime imperdoável. Há, sim, mágoas exageradas. Quem não tem
condutas reprocháveis ao longo da existência, por mais austero seja em relação
a si mesmo, observando os Códigos da justiça e da religião? Quantas vezes, em
momentos de infelicidade e de ira, pessoas boas e generosas, devotadas ao Pai e
ao dever, rebelam-se e agem incorretamente? Será justo desconhecer-lhes toda
uma trajetória de dignidade por um momento de alucinação, de torpor mental pela
ira asselvajada que lhes tomou a consciência?
É necessário, portanto, perdoar-se todas as formas de agressão,
entregando-as ao amor do Pai Incomparável, a tomar nas mãos a lei e a justiça,
aplicando-as conforme o desconforto de que se é objeto.
Assim fazendo, torna-se digno de também ser perdoado.
Esse é o sublime comportamento do amor, em forma de benignidade para com
o próximo, o irmão da retaguarda evolutiva.
Depois do silêncio que se abateu natural, no círculo de amigos, Ele adiu
gentilmente:
Convém recordar-se, igualmente, que todos necessitam do perdão para as
suas ações infelizes, desse modo, devendo perdoar-se, purificar a mente,
permitir-se o direito de errar, compreendendo a sua humanidade e fraqueza, mas
não permanecendo no deslize moral nem se comprazendo em ficar na situação a que
foi arrojado.
O autoperdão é conquista do amor que se renova e compreende que se está
em processo de renovação e de autoiluminação.
Assim, portanto, rogando-se ao Pai perdão pelos próprios delitos,
amplia-se o pensamento e alcança-se o agressor digno de ser perdoado também.
A noite prosseguia rica de suaves perfumes e incrustada dos diamantes
estelares, registrou a lição imorredoura do perdão a todas as ofensas.
Amélia
Rodrigues
Psicografia de Divaldo Pereira Franco,
Psicografia de Divaldo Pereira Franco,
no lar de Armandine e Dominique Chéron,
na manhã de 5 de junho de 2014,
em Vitry-sur-Seine, França.
em Vitry-sur-Seine, França.
Em 18.1.2016.
(*) Mateus: 5:23 a 26.
Nota
da autora espiritual.
Fonte:
Divaldo Franco
www.divaldofranco.com.br
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