Joanna de Ângelis,
da obra "Psicologia da Gratidão"
À medida que a psique desenvolve
a consciência, fazendo-a superar os níveis primitivos recheados pela sombra,
mais facilmente adquire a capacidade da gratidão.
A sombra, que resulta dos
fenômenos egoicos, havendo acumulado interesses inferiores, é a grande
adversária do sentimento de gratulação. Na sua ânsia de aparentar aquilo que
não conquistou, impedida pelos hábitos enfermiços, projeta os conflitos nas
demais pessoas, sem a lucidez necessária para confiar e servir. Servindo-se dos
outros, supõe que assim fazem todos os demais, ante a impossibilidade de
alargar a generosidade, que lhe facultaria o amadurecimento psicológico para a
saudável convivência social, para o desenvolvimento interior dos valores nobres
do amor e da solidariedade.
A miopia emocional defluente do
predomínio da sombra no comportamento do ser humano impede-o que veja a
harmonia existente na vida.
As imperfeições morais que não
foram modificadas pelo processo da sua diluição e substituição pelas conquistas
éticas atormentam o ser, fazendo-o refratário, senão hostil a todos os
movimentos libertários.
Não há no seu emocional, em
conseqüência, nenhum espaço para o louvor, o júbilo, a gratidão.
Desse modo, os conflitos que se
originaram em outras existências e tornaram-se parte significativa do ego
predominam no indivíduo inseguro e sofredor, que se refugia na autocompaixão ou
na vingança, de forma que chame a atenção, que receba compensação narcisista,
aplauso, preservando sempre suspeitas infundadas quanto à validade do que lhe é
oferecido, pela consciência de saber que não é merecedor de tais tributos...
Acumuladas e preservadas as
sensações que se converteram em emoções de suspeita em de ira, de
descontentamento e amargura, projetam-nas nas demais pessoas, por não acreditar
em lealdade, amor e abnegação.
Se alguém é dedicado ao bem na
comunidade, é tido como dissimulador, porque essa seria a sua atitude (da
sombra).
Se outrem reparte alegria e
constrói solidariedade, a inveja que se lhe encontra arquivada no inconsciente
acha meios de denominá-lo como bajulador e pusilânime, pois que, por sua vez,
não conseguiria desempenhar as mesmas tarefas com naturalidade. A ausência de
maturidade afetiva isola o indivíduo na amargura e na autopunição.
Tudo quanto lhe constitui
impedimento mascara e transfere para os outros, assumindo postura crítica
impiedosa, puritanismo exagerado, buscando sempre desconsiderar os
comportamentos louváveis do próximo que lhe inspiram antipatia.
Assim age porque a sua é uma
consciência adormecida, não habituada aos vôos expressivos da fraternidade e da
compreensão, que somente se harmonizando com o grupo no qual vive é que poderá
apresentar-se plena.
Autoconscientizando-se da sua
estrutura emocional mediante o discernimento do dever, o que significa
amadurecer, conseguirá realizar o parto libertador do ego, dele retirando as
suas mazelas, lapidando as crostas externas qual ocorre com o diamante bruto
que oculta o brilho das estrelas que se encontram no seu interior.
Urge, pois, adotar nova conduta
para se libertar das fixações perversas. Conseguindo despertar dos valores
nobres, é inevitável a saída da sua individualidade para a convivência com a
coletividade, onde mais se aprimorará, aprendendo a conquistar emoções
superiores que o enriquecerão de alegria e de paz, deslumbrando-se ante as
bênçãos da vida que adornam tudo, assimilando-as em vez de reclamando sempre,
pela impossibilidade de percebê-las.
O ingrato, diante do seu atraso
emocional, reclama de tudo, desde os fatores climatéricos aos humanos de
relacionamentos, desde os orgânicos aos emocionais, sempre com a verruma da
acusação ou da autojustificação assim como do mal-estar a que se agarra em
seguro mecanismo de fuga da realidade.
Nos níveis nobres da consciência
de si e da cósmica, a gratidão aureola-se de júbilos, e os sentimentos não mais
permanecem adstritos ao eu, ao meu, ampliando-se ao nós, a mim e a você, a
todos juntos.
A gratidão é a assinatura de deus
colocada na Sua obra.
Quando se enraíza no sentimento
humano logra proporcionar harmonia interna, liberação de conflitos, saúde
emocional, por luzir como estrela na imensidão sideral...
Por extensão, aquele que se faz agradecido
torna-se veículo do sublime autógrafo, assinalando a vida e a natureza com a
presença dEle.
Quando o egoísta insensatamente
aponta as tragédias do cotidiano, as aberrações que assolam a sociedade,
somente observa o lado mau e negativo do mundo, está exumando os seus
sentimentos inconscientes arquivados, vibrantes, sem a coragem de externá-los,
de dar-lhes campo livre no consciente.
A paz de fora inicia-se no cerne
de cada ser. Também assim é a gratidão. Ao invés do anseio de recebê-la,
tornar-se-lhe o doador espontâneo e curar-se de todas as mazelas, ensejando
harmonia generalizada.
A vida sem gratidão é estéril e
vazia de significado existencial.
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