Conta-se que vivia, em
um velho hotel em Marrakech, um homem de nome Vladimir Kolievich.
Falava pouco e quando
conversava com os outros hóspedes não fazia referências sobre seu passado.
Deixava, às vezes,
escapar observações eruditas, que davam mostras de grande e extraordinário
saber.
Uma noite, quando
vários hóspedes se encontravam reunidos na sala, uma jovem escritora russa
perguntou se alguém saberia onde ficava um rio de nome Falgu.
Embora fossem pessoas
cultas e estudiosas, todos confessaram ignorar tal informação.
Para surpresa geral,
porém, o misterioso Vladimir aproximou-se dizendo:
O rio Falgu fica perto
da cidade de Gaya, na Índia.
Para os budistas é
considerado um rio sagrado, pois junto a ele Buda teria recebido a inspiração
divina.
Diante da admiração de
todos, continuou:
Seu leito apresenta-se
coberto de areia, parecendo eternamente seco, árido como um deserto.
O viajante que dele se
aproxima não vê água, nem ouve o menor rumor do líquido.
Cavando-se, no entanto,
alguns palmos na areia, encontra-se um lençol de água pura e límpida.
E, com a simplicidade e
a clareza peculiares aos grandes sábios, passou a contar coisas curiosas, não
só da Índia, mas também de diversas partes do mundo.
Falou sobre filanezes,
espécie de cadeiras usadas pelos habitantes de Madagascar, quando viajam.
Depois, discorreu a
respeito da vida e da obra de diversos romancistas franceses.
Todos estavam admirados
com a facilidade com que ele passava de um assunto para outro, sem perder a
segurança, não deixando pairar qualquer dúvida sobre a extensão de seus
conhecimentos.
De repente, começou uma
forte ventania e alguns dos presentes demonstraram intranquilidade.
Vladimir acalmou a
todos, tecendo comentários esclarecedores sobre variados flagelos da natureza.
No dia seguinte um dos
hóspedes, seriamente intrigado, procurou-o para saber, afinal, quem seria
aquele sábio que quase passara ignorado.
O senhor nos maravilhou
ontem com seu saber. Não imaginávamos que tivesse tão grande cultura. Na sua
academia, com certeza...
Foi interrompido por
Vladimir que se sentia muito constrangido pela forma como era tratado.
Não me considere um
sábio. Eu pouco sei, ou melhor, nada sei.
Não reparou nas
palavras de que tratei? Falgu, filanezes, França, flagelos... Todas começam com
a letra “f”.
Como o seu interlocutor
mostrasse surpresa, explicou:
Estive, por motivos
políticos, preso durante dez anos nas prisões da Sibéria. O condenado que havia
ficado antes na cela em que me puseram, deixou os restos de uma velha
enciclopédia.
Como não havia com o
que mais me ocupar, li e reli, centenas de vezes aquelas páginas. Eram todas da
letra “f”.
Sou precisamente o
contrário do rio Falgu, pois pareço possuir uma correnteza enorme e profunda de
saber. No entanto, minha erudição não vai além de alguns verbetes decorados de
uma velha enciclopédia.
* * *
Costumamos nos iludir
facilmente com aparências e belas palavras.
Criamos expectativas,
idolatramos os outros para, logo em seguida, ao conhecê-los um pouco melhor,
nos dizermos desapontados e desiludidos.
Só se desilude quem se
ilude, porque buscamos mitos e modelos em seres tão imperfeitos quanto nós
mesmos.
Jesus, nosso Irmão e
Mestre é o único Modelo seguro do qual podemos nos valer, hoje e sempre.
Redação do Momento
Espírita,
com base em capítulo
Do livro Os melhores
contos,
de Malba Tahan,
ed. Record.
Em 15.9.2016.
Fonte: Momento Espírita
www.momento.com.br
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